Adriana Rocha
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DIÁLOGOS ATUAIS
A superfície uniforme e sem interferência constitui um desafio inquietante para o homem, seja essa a de uma televisão desligada, de uma tela de cinema ou para a pintura, seja da parede edificada. Deseja-se o início de um enredo, a convivência de formas e efeitos, a vibração da energia do outro, que criou o filme, o trabalho plástico ou televisivo. Brota a comunicação, com um receptor anônimo, embora possível de ser tipificado, segundo o evento assistido.
A atração por uma narrativa tem sido inseparável companheira das artes plásticas, podendo emergir de uma sentença enunciada por palavras, fórmulas, números, linhas, planos e cores. Não é suficiente justapô-los para conseguir uma obra de arte, onde a magia do jogo simbólico nos desprega de um centro imutável. Há algo mais e, nesse campo, trabalhamos com hipóteses, que incluem a competência do ofício, o frescor da intenção e a inventividade do agente.
Quantos desenham, pintam, criam filmes e programas de TV, mas, quais os que transgridem a banalidade ? Isso pode acontecer em alguns momentos, e não em todos, mesmo na produção de artistas especiais, sendo gastos rolos e rolos para se alcançar um produto singular, capaz de levar a um fluidor todos os pressupostos norteadores de caminho de criação, causando-lhe uma sensação diferenciada e positiva.
A atual produção de Adriana Rocha e Maria Cecília Mayer levam-nos a essas reflexões, pois há uma forte narrativa imanente, onde cristalizam em cada trabalho situações plenas de significados sociais, psicológicos e intrigantes, não faltando certa dose de bom humor ao exporem os problemas desse tempo, ordenados com formas construtivas.
Adriana acentua a sílaba e o pólo masculino e feminino, valendo-se de grandes planos uniformes, contracenando com texturas vivenciadas nas colagens. Há um tratamento caro para as manifestações “pop” dos anos 60, feito nas soluções gráficas, avizinhadas daquelas encontradas nos cartazes e revistas da cidade. A tipografia comumente utilizada em suas telas reforça essa identificação, servindo de pista para a compreensão do enredo.
Igualmente contrasta o fosco e o brilhante, o denso e o fluído e as tonalidades cromáticas, que hoje estão mais para “Bye bye Brasil” do que para “La nave va”. Sem dúvida, as festas brasileiras convergem com o urbano cosmopolita, incluindo do maracatu às folias de reis, produzindo um efeito ressáltavel.
A fragmentação dos planos e as sutilezas são intersecções visíveis no trabalho das duas, que tiveram um período formativo semelhante e que inclui a freqüência ao curso de desenho de Fajardo. Entretanto, o mapa da vida de cada uma alterou os roteiros, acrescentando nuances e preocupações, geradoras de especificidades próprias, que conversam com proximidade. Reunidas as duas produções na Galeria da Pinacoteca, intensificam-se os diálogos entre as obras de uma mesma artista, renascem aqueles entre elas, emergindo uma sonoridade acalorada e contemporânea, bastante propícia às sensibilidades contemporâneas.
21 de junho de 1985
Ciça França Lourenço
Diretora da Pinacoteca do Estado, São Paulo